Um país de brandos costumes

A decisão de passar todas estas palavras para a forma escrita ficou decidida após ver o cartoon do Gonçalo Viana para a revista Visão. Quando algo me incomoda muito, fica alí, como uma farpa no dedo que não se consegue tirar, por mais que escabichemos. Escrevo os textos mentalmente durante dias a fio, a decisão de passar para o papel, ou neste caso para bits, fica dependente desse passar de dias, em que espero o resultado do escabichanço. Por vezes a farpa sai e já não sinto necessidade de a escrever.

Vem do tempo de Salazar e aparentemente nada mudou. Somos o país dos 3 F's: Fado, Fátima e Futebol (não necessariamente por esta ordem de importância). Já diziam os Romanos "dá-lhes pão e vinho".

O Benfica ganha o campeonato e na mesma noite, nos noticiários, é anunciada a subida das taxas de IRS, no dia seguinte só se ouvia falar do Glorioso. Depois veio o Papa, que nos custou milhares de euros, graças à nossa opulência burguesa e que como é óbvio foi a Fátima e mais uma vez se falou de tudo menos do que importa. Ainda se falou do concerto dos "Amália hoje" em Shangai, que de tudo isto é ainda o que se aproveita. E neste momento temos um país enebriado pelo Mundial de Futebol.

Transformam-se SCUTs em Auto-estradas para se cobrar portagens. Ir de Viana do Castelo ao Porto ou vice-versa vai custar mais de 8 euros. Será que o governo tem noção da quantidade de pessoas que fazem esse percurso diariamente para trabalhar? Ou terão noção do tempo que demora a fazer o percurso pela antiga estrada nacional? Eu pergunto-me inclusivé se muitos deles saberão deslocar-se de outra forma que não seja com carros de batedores!!!

Sobe-se o IVA e o IRS e com isso o preço dos serviços básicos, luz, àgua e gás que já sofreram aumentos no início do ano vão novamente aumentar, e depois vem a comida, os combustíveis, a roupa, os medicamentos... E quando tudo sobe é quando as pessoas passam a ganhar menos porque a taxa de IRS também subiu. É a teoria da bota de elástico, conseguir fazer o mesmo, com menos dinheiro, mas pagando mais por esses mesmos bens e serviços.

O governo corta 5% nos ordenados, mas aumenta em 25% as despesas de representação dos deputados. E gasta mais algum a comprar o 3º computador para cada deputado, e mais algum para umas obrinhas no parlamento. E não se pode adiar o TGV. Nem pedir aos desempregados que façam trabalho de voluntariado. Fiscalizar os casos de Rendimento Social de Inserção é coisa para se ir fazendo.

E eu que já fiz o 9º ano há muuuuuuito tempo gostava de perceber porque raio é que se tornou dispensável. Aparentemente nem a própria Ministra da Educação o sabe explicar muito bem.

Há quem diga "ahhhhh e tal somos latinos, gostamos é de sol!!!" e eu penso no julgamento Maxi, o maior julgamento de mafiosos italianos (se há alguém tão latino como nós serão eles não?!) composto por 474 arguidos, uma testemunha chave, e que passados 22 meses estava terminado e lida a sentença. Foram condenados 360 dos arguidos.
Por comparação temos o processo Casa Pia, com 7 arguidos, um número elevado de testemunhas e que está em julgamento desde Novembro de 2004, ou seja, há quase 6 anos.
Não me digam que é da complexidade da coisa, porque mais complexos que os esquemas da máfia deve ser difícil.

Agora podia enumerar uma série de palavrões que gostaria de chamar a todos os srs que diariamente vestem um fato, colocam uma gravata, deixam a coluna vertebral no armário da roupa e se sentam numa cadeira para nos chamar BURROS à descarada, para nos abrirem a carteira, para nos obrigarem a fazer sacrifícios sem darem o exemplo.

Não me entendam mal, não tenho nada contra pagar impostos, e elevados até, desde que eu veja o retorno disso com berçários, creches, jardins de infância e escolas grátis, com condições e horários decentes. Com hospitais funcionais, transportes funcionais, preços justos, serviços públicos organizados, diminuição da taxa de crimes, justiça célere. Mas eu pago os meus impostos e tenho que pagar por tudo o resto.
Finito.

Mais uma pérola do Ricardo Araújo Pereira para quem quiser ler

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